Nunca colocamos tanto verniz na vida quanto em tempos de Instagram; Belas fotos, belos filtros e a exuberante beleza da vida gritando todos os dias nas telas que ocupam cotidianamente os olhos de um número assustador de pessoas, por um número de horas ainda mais assustador.
Não me entendam mal, não sou avessa à beleza e ao ato de embelezar a existência nos seus menores detalhes, afinal quem em sã consciência seria? Na verdade, eu estaria na linha de frente de um movimento que defendesse o belo das coisas, se isso fosse necessário. Também não sou avessa ao Instagram. Sou apaixonada por fotos, bem como vejo nas edições de imagens uma fonte de criatividade e novas belezas para o mundo, algo realmente artístico. Entretanto, não posso evitar a reflexão a respeito do quão banalizadas e o quão frequentemente desalmadas se tornaram as publicações nessa rede. Parece haver muita beleza, mas nenhuma essência. Há um vazio onde poderia haver verdade. Identificamos, em suma, um apelo estético.
Com isso, não estou querendo dizer que as pessoas deveriam postar fotos em suas cores originais, com qualidade original apenas para endossar o “verdadeiro”, mas somente me colocando a pensar nas consequências desse processo inevitável e quase normal, tendo em vista que há filtros em abundância e que possuímos, sem muita dificuldade, uma câmera razoável constantemente em mãos. Tantas fotos bonitas, misturadas em um mar de fotos bonitas, que se torna cada vez mais difícil você conseguir visualizar qualquer coisa para além da superfície. O que talvez não fosse necessário, se fossemos subestimar o efeito dessa superfície em nossos estados psicológicos. Quanto a isso, não é difícil encontrarmos pesquisas apontando as consequências nocivas que o consumo desenfreado desse mar de beleza causa em nossas mentes, já que a vida real nem sempre se assemelha ao colorido da tela.
O veneno está na dose, não é mesmo?
Não sem razão, eu poderia dizer a vocês que o belo é apontado frequentemente pela ciência como uma excelente fonte de bem-estar, então vocês poderiam me acusar de contradição, afinal como a beleza pode ser ruim, sendo ela tão boa?
A diferença da beleza proveniente da vida em si, isto é, daquela que acontece quando estamos distantes da internet, não pode ser comparada à beleza que visualizamos no âmbito digital. Já que quando presenciamos o belo na vida, mais do que a visualização, o temos enquanto sensação. A beleza pode trazer calma, paz e podemos dedicar horas de nossas vidas à contemplação, sem que com isso tenhamos nosso tempo perdido nutrindo ansiedades e medos ao deslizar o feed. Um belo entardecer, uma obra de arte, uma arquitetura rica, pode nos contagiar, sem nos poluir. Contemplar a beleza da vida no âmbito real é também uma forma de aprimorar nosso senso estético, expandir nossos horizontes, bem como uma forma de evitar a desidratação que o consumo exagerado dos mares de belezas virtuais pode acarretar em nossas mentes.
Aparte isso, é inegável que compartilhar imagens com nossos amigos é algo que faz parte de nossas vidas, bem como visualizarmos as deles, mas o ponto consiste em nosso bom uso dessa ferramenta. Não há tanto mal em bebermos refrigerante às vezes, mas se você beber só refrigerante, todos os dias, eventualmente a ausência da sua saúde vai gritar mais alto que o ilusório sabor dos refrigerantes bebidos.
Fundadora dos sites Vida em Equilíbrio e Demasiado Humano. Graduada em Filosofia pela Universidade Federal de Pelotas. Atualmente é mestranda em Filosofia Moral e Política pela mesma universidade, trabalhando questões sobre o conceito de liberdade com ênfase no idealismo alemão.
Isadora também está presente no Youtube através do seu canal Relatos de Motocicleta.